"Maic Literário: Ficções Cotidianas".
Aqui, você vai encontrar uma poesia, um poema ou um Conto ficcional.
A tarefa
Com o puxar da coberta, Jorge percebeu que era hora de acordar (estudava no turno da manhã).
Com o corpo pesado, cabeça perturbada e, se pudesse, continuaria a dormir, atendeu ao pedido de sua mãe, quando ela ordenou:
- Acorde menino, senão vai chegar atrasado!
Foi com gestos lentos que se descobriu de tudo, caminhou até a cômoda, apanhou o seu uniforme (corriqueiro da instituição de ensino).
Se vestiu e andou até a cozinha.
Rente a mesa, uma chaleira.
O liquido no interior dela, frio.
Sua mãe pregava que se fosse esquentar a bebida, poderia faltar gás para o preparo do almoço.
Um pão do dia anterior. Uma, ou, duas passadas de manteiga no meio dele, seria suficiente, segundo o seu pai, para aguentar até a hora da merenda na escola. "Quando eu tinha a sua idade, nem isso tinha em casa", quase todos os dias, Jorge ouvia a lamentação do seu genitor.
Entre sentir frio no braço, vontade de comer mais um pedaço de pão, ou, uma bolacha recheada, se houvesse?, testemunhar as teias de aranhas pelo teto de madeira da cozinha, o piso de vermelhão, cheio de buracos (parecendo um campo minado) e as tabuas das paredes, cheia de peças, já, podres, Jorge apanhou a sua mochila, por de cima do fogão à lenha e depois de deixar a porta que dava para o quintal, disse:
- Tchau mãe?!
- Tchau filho...
Cerca de duzentos metros da casa, seguindo um carreiro de capim alto derredor, próximo a uma cerca de madeira pintada de branco, esperaria a van escolar, que o deixaria no colégio Padre Chagas.
Não deu cinco minutos, percebeu quando o automóvel apareceu depois da curva e deixando um pó alto na estrada, estaria pronta para que ele embarcasse nela.
Foi o veiculo, com cuidado, estacionar, como de todo os outros dia da semana, Jorge tirou a sua mochila das costas, levou para frente da barriga e, rapidinho, como ajuda de uma outra criança que abriu a porta de ferro do carro, se acomodou em um dos bancos almofadados do transporte.
Dali, até a cidade, como era legal: sentiria um friozinho no estomago, quando passassem por de cima da ponte de madeira, dois quilômetros adiante; ia conversando com seus colegas, passagem bobas do fim de semana; por entre as outras fazendas, enxergaria: cavalos, plantações, pinus de doze metros de altura que sumiam para o céu...
No asfalto, era: os sinaleiros, os prédios erguidos de concreto, mercados, lojas, a catedral central...
Fim da locomoção, foi a corrida até a sala de aula, se aprumar em sua cadeira e aguardar o professor, que, sempre esperava que todos os alunos se acomodassem primeiro rente as carteiras, depois ele chegaria trabalhar.
Entre sair da van escolar, debaixo de algazarras, empurrões, gritarias, e esperar a fila até a marcha para a sala de aula, foi o professor Henrique de geografia que mais uma semana letiva, estava começando a partir desse momento:
- Bom dia crianças...
- Bom dia professorrrrr..... - todos num coral só, numa harmonia fora de tom, responderam.
Depois de fazer a breve chamada deles, contar uma piadas sem graça, e dar uma ajeitada no seu jaleco de cor branco, o professor orientou:
- Tragam a lição de casa, classificação das nuvens, estratiformes, fibrosas, cumuliformes, para que eu possa dar uma conferida...
Aquilo para Jorge, como de todas as outras vezes, desde de quando chegou na sexta serie, foi mesma coisa que um aviso de um parente morto na família. De tanta surpresa.
Única coisa que se lembrava, foi que na sexta-feira, depois que saiu da van escolar, encontrou o tio Paulo próximo a cerca branca da chácara, caído ao chão de bêbado, e o ajudou a levá-lo para casa. Depois, lembrou que a mãe pediu para que ele levasse a Capelinha da paróquia São Sebastião, na casa da tia Lucia, onde, já estava com um dia de atraso. Nesse itinerário, na volta, encontrou como o Serginho e o Pedro, foram juntos pelas margens da estrada, juntar pinhão para venderem para o Sr. Izidoro (única Bodega da região agrária que moravam, faziam uns vinte anos).
"Lição de casa de geografia? Da onde foi que o professor tirou isso?", quis entender o menino.
- Jorge!
- Sim professor...
- Seu caderno, só falta você...
- Eu não fiz a lição professor... - rosto baixo da criança.
Alguns dos seus coleguinhas caçoaram dele, de uma forma tímida.
Com a sua face inchada e seus olhos azuis de raios penetrantes, o professor Henrique só se ateu:
- Se lembre Jorge, a vida não é só vídeo game. Se as tarefas escolares, não houvesse "aprendizado" nelas, elas não seriam solicitadas.
Autor: Denis Santos (Guarapuava PR).
Emergência
Enquanto um cantor, num programa de palco, tentava dar o melhor de sí, o doutor Serafim e a enfermeira Jocasta, caiam nas gargalhadas.O plantão era no PA do "Hospital São Francisco" - cidade de Pontápolis (quarenta e seis quilômetros, afastada de Guarapuava) .Por entre as cadeiras espalhadas pelo pátio do centro médico, os familiares dos que já estavam sendo atendidos, por pediatras, dermatologistas, ortopedistas... também davam gargalhadas.Todos tiraram as faces voltadas para a tela eletrônica, quando ouviram ao longe a sirene de uma ambulância que - turbinada - parecia chegar na instituição médica.Foram em poucas frações de movimentos: estacionaram o automóvel de modo cuidadoso poucos metros da porta de vidro; retiraram o paciente; correram com ele para um dos interiores das alas e, o doutor Serafim, já estava em cima do doente, prestar sua especialidade.- O que aconteceu?Uma das paramédicas (vestida com o seu uniforme habitual, luva cirúrgicas em punhos e de olhos azuis), respondeu:- Disseram que estava empinando uma moto, doutor, o encontramos no meio da rua!Se tratava de um adolescente com o cabelo cortado com a máquina número zero ao lado. Estava com a perna esquerda toda esfolada, um dos pés torcido, o braço direito, nitidamente, quebrado, e, um talho na cabeça, com um sangue um tanto escuro, deslizava para parte do rosto.Face de estranheza do Dr. Serafim. Espiava o jeito do sujeito que o preparavam para transportá-lo para o leito, que só poderia não estava gritando de dor, porque talvez isso não valesse a pena. Mas "motivo" ele tinha.O clinico geral fez o melhor que pode: limpou com cuidado os aranhados em sua perna; parte do corpo chegou o enfaixar e, em seguida, depois que chegasse o raio x do braço dele, o engessaria.Passando-se alguns momentos, em silêncio, tecnicamente, tomando a maior das precauções, enxergando o que conseguia depois das lentes dos seus óculos de tartaruga, o médico juntava o talho aberto no crânio do paciente, com uma linha escura, sentado numa banqueta de plástico, próximo à face do enfermo.De repente ouviu:"Há, há, há... há, há, há... há, há, há...".Achou estranho aquele eco, naquela hora da madrugada, vindo de algum lugar da rua."Tummm... blammm..., tlummm...".Parou por um segundo de colar parte do tecido humano, um, no outro, quando imaginou que a festa, sem data antecipada, marcada, estava acontecendo era dentro da instituição pública.Foi nesse momento que a enfermeira Jocasta entrou no cômodo. Deixou parte da porta aberta.Nisso, Serafim enxergou que do outro lado da madeira, os parentes, amigos e conhecidos dos que estavam sendo atendidos, davam risadas inconscientemente (em vozes altas, entrecortadas entre elas). Vezes, os ocupantes dos acentos almofadados, batiam as mãos (tamanho impacto da nostalgia).- Mas o que está acontecendo, enfermeira?- Estão se divertindo com aquele programa de palco, doutor!Jocasta entrou e já ia sair, parou na porta e explicou:- Chegou outra emergência, doutor. Um menino mordido por uma aranha marrom. Já volto ajudar o senhor... - foi embora.Serafim abaixou a cabeça. Permaneceu em silêncio. Voltou a se concentrar na desgraça em parte do crânio do menino que, provavelmente, estava se exibindo em pública e por pouco não perdeu a vida.Percebeu que o paciente, além de dor, também estaria sentindo frio. No corpo, cobrindo partes da pele carnal, somente uma calça jeans de cor azul."Há, há, há... há, há, há... há, há, há...".Antemão havia verificado a perna do garoto com escoriações permanentes, o braço quebrado dele, e o rasgo na cabeça, agora, mais clinicamente, percebeu que ele também tinha hematomas próximo a costa, em varias partes da barriga e o seu pé direito, ele não deixaria o homem ir embora, sem antes providenciar também um raio x dele. O lugar, imaginou, também poderia estar quebrado."Tummm... blammm..., tlummm...".Descontração, alegrias e divertimento do povo (os que não estavam sentindo dor naquele momento).Sem mais pensar Dr. Serafim foi terminando sua atividade.Não chegou a trocar palavra com o paciente que ele dera atendimento.No fundo, achou que maior parte do tempo, o ferido, passara no leito, mais "dormindo", do que acordado. Voltaria depois de uns dez minutos, pronto para engessar o seu braço.Tirando suas luvas cirúrgicas e as despejando num cesto de lixo de alumínio, próximo a porta, sem mesmo olhar para trás, o médico deixou o recinto.Cabisbaixo, caminhando, se sentia cansado.Até quando teria que trabalhar virando turnos de madrugadas? Como seria o resto do plantão, até o fim da noite? Quando alguns seres humanos criariam juízo em dar mais valor a vida?Sem mais o que lamentar, voltou a procurar o balcão da recepção do hospital.Perto dele, não achou conivente ficar no meio da multidão que se divertia, em meio ao sofrimento de um acidentado ao lado, que para ele, a vida não estava sendo nada fácil.Pensou apenas em avisar a enfermeira Jocasta que, caso precisassem dele, o encontrariam, pronto para qualquer emergência, no refeitório (tomando em café), mais não a enxergou no lugar.Em silêncio, sumiu em meio ao corredor largo e alto do hospital, tentar esquecer a dor da vida enfrentada, no liquido preto.
Autor: Denis Santos (Guarapuava PR).
Autor: Denis Santos (Guarapuava PR).